O “Home Office” ou Teletrabalho – segundo sua denominação técnica presente na CLT- regime largamente praticado em alguns setores da economia, devido à pandemia de Covid-19 se espalhou por praticamente todas as atividades e empresas durante o ano de 2020. Até mesmo o judiciário passou a realizar as suas atividades de maneira remota, a partir da residência dos servidores e juízes. A prática parece que veio para ficar, se revelando uma das raras ocasiões em que ambas as partes – empregador e empregado – percebem vantagens. Entretanto, a adoção informal do teletrabalho em 2020 necessita ser regularizada pelas empresas e trabalhadores, com o objetivo de adequar a prática aos preceitos legais.
O teletrabalho é regulamentado pela CLT desde a Reforma Trabalhista de 2017, em seus artigos 75-A a 75-E, que estabelecem obrigações formais para ambas as partes para a adoção do regime. Entretanto, com a emergência da pandemia de Covid-19, o Governo Federal editou a Medida Provisória 927, dispensando as formalidades previstas em lei para a adoção do “home office”. Praticamente todas as empresas o adotaram, de maneira totalmente informal. Ocorre que a MP 927 não se encontra mais em vigência, sendo imperativa a adoção das medidas previstas na legislação (no caso, a CLT) para a regularização do teletrabalho nas empresas.
O artigo 75-B da CLT traz a definição de teletrabalho, considerado como a situação na qual a prestação de serviços ocorre fora das dependências do empregador, por meio de tecnologia da informação.
Art. 75-B. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.
Como característica deste regime, nele o empregado não está sujeito a controle de jornada, conforme o artigo 62, inciso III da CLT, o que implica em não haver direito a recebimento de horas extras, ainda que o mesmo compareça esporadicamente à empresa para a realização de reuniões, por exemplo.
Também não há a necessidade de fornecimento de vale-transporte por parte do empregador, uma vez que o trabalho, na maior parte das vezes, é realizado no domicílio do empregado, eliminando a necessidade de deslocamento.
Como podemos verificar, há vantagens para ambas as partes. O trabalhador não precisa se deslocar para o local de trabalho e goza de mais liberdade para realizar suas atividades. A empresa pode economizar com vale-transporte e outros custos oriundos da presença dos empregados em suas dependências, desde a conta de luz até o aluguel do próprio local de trabalho.
Porém, para que a adoção do regime seja realizada conforme a lei, os artigos 75-C a 75-E prevêem as formalidades a serem adotadas. O artigo 75-C determina que o teletrabalho deve constar do contrato individual de trabalho, bem como as atividades a serem desenvolvidas pelo empregado. Entendemos, então, que, na adoção do teletrabalho ao longo do contrato de trabalho, um aditivo deve ser firmado indicando sua inclusão.
Uma das maiores vantagens para a empresa na adoção do teletrabalho reside na redução dos custos referentes à infraestrutura do estabelecimento, que deixam de ser necessários quando as atividades são realizadas neste regime. Dentro desta infraestrutura podemos incluir desde o local propriamente dito, móveis, computadores, energia, água, telefone, internet… até o cafezinho entra nessa conta. Entretanto, estes recursos não desaparecem. Eles são, de certa forma, transferidos para o domicílio do empregado. Para disciplinar essa transferência, o artigo 75-D da CLT prevê que a responsabilidade pelos custos com a aquisição e manutenção da infraestrutura para a realização do teletrabalho deve ser prevista em contrato escrito, e seu parágrafo único dispõe que as utilidades não integram a remuneração do empregado, de certa forma já prevendo que estas devem ser fornecidas pelo empregador.
Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.
Parágrafo único. As utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado.
Este artigo deve ser observado com máxima atenção pelas empresas. A ausência de contrato escrito certamente levará a uma condenação imposta ao empregador, obrigando-o a reembolsar todos os custos incorridos pelo empregado com a infraestrutura ao longo do contrato de trabalho, pois, devido ao princípio da alteridade, todos os riscos da atividade devem correr por conta do empregador. Além disso, conforme já mencionado, a infraestrutura pode incluir diversos itens, desde o aluguel do espaço utilizado na residência do empregado, passando por sua conta de energia, internet, material de escritório e até o cafezinho, o que pode elevar os custos e eliminar toda a economia realizada pela empresa ao longo do tempo.
Por fim, o artigo 75-E dispõe sobre a prevenção de doenças do trabalho, mesmo quando este é realizado de forma remota. O empregador deverá instruir expressamente os empregados sobre as precauções a serem adotadas e este deverá se comprometer a seguir as orientações, conforme seu parágrafo único.
Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.
Embora se possa perceber a intenção de livrar o empregador da responsabilidade em caso de ocorrência de uma doença do trabalho, há divergência doutrinária com relação ao tema. Segundo Delgado e Delgado (2017), a mera assinatura deste termo não exclui a responsabilidade do empregador na ocorrência de doenças do trabalho, mesmo em regime de “home office”. Logo, se por um lado a adoção do procedimento não exclui a responsabilidade do empregador nestes casos, a sua inobservância com certeza fará recair sobre o empregador os ônus decorrentes da doença adquirida pelo empregado.
Concluindo, o Teletrabalho é uma realidade nas empresas atualmente, e assim deve continuar por muito tempo, talvez se tornando o principal regime de trabalho a ser adotado pelos empregadores e empregados no dito “novo normal” pós pandemia. Entretanto, as formalidades legais previstas na CLT precisam ser observadas, com o objetivo de preservar as vantagens obtidas com o regime e evitar futuros conflitos entre empregados e empregadores na justiça do trabalho.
Em razão da relevância deste tema na vida das empresas e trabalhadores, a Justiça do Trabalho, através do Tribunal Superior do Trabalho, veiculou material educativo com a sua visão sobre o teletrabalho como direitos, vantagens, desvantagens, dicas de saúde, de ergonomia e de tecnologia, além de trazer um breve panorama do teletrabalho no Brasil em 2020.
Consulte aqui o Manual sobre teletrabalho elaborado pela Justiça do Trabalho.
Referências:
Consolidação das Leis do Trabalho – DEL 5452, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm
MP 927 – texto disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/mpv/mpv927impressao.htm
DELGADO, Mauricio Godinho, DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017. São Paulo : LTr, 2017.
Autoria: Alexandre Plemont Maia
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