O TELETRABALHO – UMA NOVA FORMA NA RELAÇÃO DE EMPREGO

A atual legislação trabalhista incorporou o entendimento jurisprudencial existente sobre o trabalho em “home office” em um capítulo próprio da CLT (Capítulo II-A – DO TELETRABALHO).

Com a reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017), a CLT passou a contar com previsão expressa para o chamado “TELETRABALHO”, onde ficaram estipuladas todas as regras e condições para o trabalho em sistema de “home office”.

Abaixo transcrevemos o novo capítulo II-A, da CLT:

“CAPÍTULO II-A DO TELETRABALHO
Art. 75-A. A prestação de serviços pelo empregado em regime de teletrabalho observará o disposto neste Capítulo.
Art. 75-B. Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.
Parágrafo único. O comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho.
Art. 75-C. A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado.
§ 1o Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.
§ 2o Poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual.
Art. 75-D. As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.
Parágrafo único. As utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado.
Art. 75-E. O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.
Parágrafo único. O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.”


Ficaram estipuladas as regras para a prestação de serviços em sistema de “Home Office”, regras estas que inexistiam antes da mais recente reforma trabalhista.

A CLT passou a conceituar o trabalho nestas situações como sendo “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.”

Não se trata de mero trabalho externo. O legislador criou uma nova modalidade de contrato de trabalho.

Por ser uma nova modalidade de contrato de trabalho, que foge da regra geral, há a necessidade deste regime de trabalho constar expressamente de um contrato individual de trabalho, onde devem ficam estipuladas as atividades que serão realizadas pelo empregado e, também, todas as disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho, bem como ao reembolso de eventuais despesas arcadas pelo empregado.

As empresas podem, inclusive, realizar a alteração do regime de trabalho presencial de seus empregados para o regime de teletrabalho, mas desde que haja mútuo acordo, devidamente registrado em um aditivo contratual.

Também poderá haver a alteração inversa do regime de teletrabalho para o regime presencial, até por determinação exclusiva do empregador, desde que seja garantido um prazo mínimo de 15 (quinze) dias para adaptação do empregado e, também, mediante registro em aditivo contratual. Nesta hipótese não há a necessidade da anuência do empregado.

A legislação ainda prevê a necessidade de o empregador instruir seus empregados de maneira expressa e ostensiva quanto às precauções que devem ser tomadas a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, mediante termo de responsabilidade onde o empregado se compromete a seguir as instruções do empregador.

Mas não basta constar do aditivo ao contrato de trabalho, é indispensável que a empresa envie constantemente comunicados aos colaboradores com orientações claras e precisas sobre a necessidade de realização de atividades físicas (ginastica laboral); realize exames médicos periódicos no colaborador; bem como observe se as condições ergonômicas de trabalho do colaborador são adequadas, promovendo o ajuste quando for o caso.

Outra questão importante desta nova lei é que a eventual necessidade de o empregado comparecer às dependências do empregador, em situações específicas para a realização de atividades que assim exijam, não descaracteriza esse regime de trabalho.

Com relação à jornada de trabalho, a reforma trabalhista incluiu o teletrabalhador nas exceções não abrangidas pelo capítulo que prevê a duração do trabalho, dispensando-o do registro da jornada. Pelo teor da legislação, o teletrabalhador, devidamente enquadrado nesta hipótese legal, não possui direito ao recebimento de horas extraordinárias. No entanto, é preciso ter muita cautela ao proceder este tipo de alteração.

Isto porque o regime de teletrabalho foi incluído no artigo 62, inciso III, da CLT, que exclui esses trabalhadores do regime de proteção da jornada de trabalho:

Art. 62 – Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:
I – os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados;
II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial.
III – os empregados em regime de teletrabalho.
Parágrafo único – O regime previsto neste capítulo será aplicável aos empregados mencionados no inciso II deste artigo, quando o salário do cargo de confiança, compreendendo a gratificação de função, se houver, for inferior ao valor do respectivo salário efetivo acrescido de 40% (quarenta por cento).”

O legislador, ao incluir os teletrabalhadores na exceção do artigo 62, da CLT, dispensando-os do registro da jornada, buscou refletir exatamente a realidade já vivenciada por muitos trabalhadores, atendendo às necessidades de um mundo moderno e totalmente conectado.

Teoricamente, a intenção do legislador era de manter estes trabalhadores dispensados do registro da jornada, justamente por ser o trabalho no domicílio permeado com atividades particulares, sendo impossível o controle efetivo da jornada trabalhada a favor da empresa.

Entretanto, tratando-se de uma norma relativamente nova, ainda não muito discutida pelos tribunais, todas as cautelas devem ser observadas para que a empresa não venha a sofrer, no futuro, prejuízos decorrentes de interpretação legal diversa da interpretação que os tribunais irão adotar.

Diz-se isso em razão da já conhecida interpretação conferida pelo nosso TRT aos incisos I e II do mesmo artigo 62, da CLT.

Embora os empregados incluídos na regra dos incisos I (atividade externa) e no inciso II (gerentes) também tenham sido excluídos do regime de proteção da jornada, e dispensados de registrar o horário de trabalho, sabemos que os Tribunais não aceitam este enquadramento a todos os trabalhadores, indistintamente.

Por exemplo, para os trabalhadores em atividade externa os tribunais estipularam que a norma só vale para aqueles cujo registro da jornada é “impossível”, deixando claro que havendo qualquer possibilidade de controle da jornada (seja por celular, relatórios, GPS, aplicativos, etc..) o enquadramento no inciso I, do art. 62, da CLT, é nulo. Hoje em dia, com as tecnologias de comunicação e geolocalização, quase nenhum trabalhador pode ser enquadrado nesta regra, sob a ótica dos Tribunais Trabalhistas.

O mesmo ocorre em relação aos “gerentes”, inseridos no inciso II, pois os tribunais passaram a interpretar que esta lei vale apenas para aqueles gerentes com efetivos poderes de mando e gestão, que efetivamente substituem o empregador. Ou seja, não basta cumprir com os termos da lei, contratando um empregado como gerente e efetuando o pagamento de uma gratificação de 40%. Se o gerente não tiver poderes de mando e gestão, é nulo o enquadramento na norma que o exclui do registro da jornada, sendo que o Judiciário ainda entende que os valores pagos a título de gratificação de função devem ser considerados como parte do salário do empregado e condenam as empresas ao pagamento de horas extras considerando as jornadas alegadas pelos reclamantes, uma vez que ausentes os registros de horário.

Por isso é que sugerimos muita cautela nesse momento.

Para que a empresa possa contratar um empregado para teletrabalho (Home office) é indispensável a observância estrita dos termos da lei, e ainda assim, com algumas precauções quanto à possível interpretação a ser conferida pelo judiciário trabalhista para estas situações. Como a alteração da legislação é muito recente, ainda não há jurisprudência formada e tampouco consolidada sobre esse assunto, mas é muito provável que haja resistência por parte dos Juízes, com a adoção de entendimento semelhante ao que foi conferido ao trabalho externo.

Como dito acima em relação ao trabalho externo previsto no inciso I do artigo 62, da CLT, o entendimento dos Tribunais passou a ser no sentido de que havendo “possibilidade” de controle da jornada, o enquadramento na exceção do artigo 62, da CLT, é nulo.

Para alguns Juízes do Trabalho (conforme artigo publicado no site da ANAMATRA), “para se atribuir uma interpretação conforme à Constituição, de modo a compatibilizar os dispositivos da CLT, o inciso III do art. 62 deve ser compreendido como: encontram-se excluídos da proteção da jornada os teletrabalhadores que não possuem nenhuma forma de controle do tempo de trabalho. Isto é, aqueles empregados que iniciam e terminam suas atividades no horário que bem entenderem, com total liberdade. A cobrança patronal é feita por meio de metas e resultados, sem acompanhar os momentos em que a atividade está efetivamente sendo desempenhada”.

Embora este, a nosso ver, não seja o melhor entendimento sobre esta matéria, como adotamos sempre uma postura de muita cautela, e levando em conta que uma nulidade arguida futuramente pode acarretar um prejuízo muito grande para a empresa, sugerimos que o colaborador eventualmente enquadrado nesta figura legal não sofra muita cobrança em relação à jornada de trabalho.

O ideal, conforme o entendimento de alguns Juízes, é que o colaborador tenha total liberdade para o início e término de suas atividades, com o controle da empresa feito a partir de metas e resultados. Caso contrário, havendo cobrança e fiscalização de horário, poderá haver o entendimento de que este trabalhador se enquadra na regra geral do artigo 58, da CLT, com direito a horas extraordinárias caso ultrapassada a jornada de oito horas diárias.

Não sendo possível manter o controle do colaborador mediante metas e resultados, e havendo necessidade de o trabalho ser realizado em horário tido como “comercial”, por exemplo, juntamente com os demais trabalhadores da empresa, recomendamos que seja feito o controle das jornadas trabalhadas, com o pagamento de eventuais horas extraordinárias. Neste sentido, sendo o regime do Teletrabalho uma exceção à regra geral, destacamos a importância da observância das questões acima destacadas, sob pena de nulidade do enquadramento dos empregados neste regime.

 

 

Autoria: Rafael Cajal

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Referências: https://www.anamatra.org.br/artigos/25552-o-teletrabalho-na-nova-clt