MUDANÇAS NA LEI QUE REGULA A RECUPERAÇÃO JUDICIAL, A EXTRAJUDICIAL E A FALÊNCIA DO EMPRESÁRIO E DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA (LEI Nº 11.101/2005) PELO PROJETO DE LEI 4.458/2020

O Senado aprovou no mês de novembro de 2020 o texto principal do Projeto de Lei 4.458/2020, que altera lei que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. O projeto agora aguarda a sanção presidencial para que as alterações entrem em vigor.

Petição Inicial do pedido de recuperação judicial:

O projeto de Lei prevê a inclusão do artigo 51-A, que dispõe sobre a possibilidade de o juiz nomear profissional de sua confiança, com capacidade técnica e idoneidade, para promover a constatação das reais condições de funcionamento da empresa que ingressou com pedido de recuperação judicial, além da verificação de regularidade e completude da documentação que instruiu o pedido.

Essa constatação será determinada pelo juiz sem a oitiva da empresa que ingressou com o pedido de recuperação judicial. Caso sejam detectados indícios contundentes de utilização fraudulenta da ação de recuperação judicial, o juiz poderá indeferir a petição inicial, sem prejuízo de oficiar ao Ministério Público para tomada das providências criminais eventualmente cabíveis.

Conciliação e Mediação antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial:

O projeto de Lei incluiu um capítulo inteiro (Seção II-A), que consiste nos artigos 20-A à 20-D, para regulamentação dos procedimentos de conciliação e mediação antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial.

No intuito de reforçar o uso da conciliação e da mediação no processo de recuperação e falência, o projeto de Lei inclui a possibilidade de que as empresas que preencham os requisitos legais para propor a recuperação judicial, requeiram tutela de urgência cautelar (do art. 305 Código de Processo Civil) a fim de que sejam suspensas as execuções em tramitação pelo prazo de até 60 dias, para tentativa de composição com os credores.

O texto ainda prevê o procedimento de conciliação e mediação em disputas que envolvam os sócios da empresa, concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial, órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais, credores não sujeitos à recuperação judicial e credores extraconcursais.

Possibilidade de apresentação de plano alternativo de recuperação judicial pelos credores:

Deferido o pedido de recuperação judicial, a empresa devedora tem 60 dias para apresentar o plano de recuperação judicial. Antes do projeto de Lei 4.458/2020, caso o plano apresentado pela empresa devedora fosse rejeitado pelos credores, a falência seria decretada. O projeto de Lei inovou com a possibilidade de que os credores apresentem um plano de recuperação alternativo caso o plano apresentado pela empresa devedora seja rejeitado. A medida visa ajudar a resolver o impasse na negociação entre credores e devedor acerca do plano de recuperação judicial ao autorizar os credores a apresentarem e aprovarem plano próprio.

O plano de recuperação judicial proposto pelos credores deverá cumprir algumas condições de forma cumulativa. Para que o plano de recuperação judicial possa ser apresentado pelos credores, é necessário:

 

  • O apoio de credores que representem mais de 25% dos créditos totais sujeitos a recuperação judicial ou de credores presentes na assembleia que representem mais de 35% dos créditos.
  • O plano deverá prever a isenção das garantias pessoais prestadas por pessoas naturais em relação aos créditos a serem novados e que sejam de titularidade dos credores que:

(i) componham os percentuais acima indicados como apoiadores do plano de recuperação alternativo ou;
(ii) (ii) aprovem o plano alternativo proposto, sendo vedadas eventuais ressalvas de voto.

O projeto ainda dispõe que o plano apresentado pelos credores não poderá impor aos sócios do devedor o sacrifício de seu capital maior do que viria a ter com a decretação da falência. No caso de rejeição do plano de recuperação dos credores ou a sua não apresentação, o juízo decretará a falência.

Continuação das execuções de caráter fiscal em paralelo à recuperação judicial:

Apesar da jurisprudência já entender dessa forma, o projeto de lei, através da inclusão do artigo 6º, §7º-B, reafirma que o deferimento do processamento da recuperação judicial não suspenderá as execuções de créditos fiscais.

Fomento à concessão de crédito novo (empréstimo) às empresas em recuperação judicial:

Outra novidade do Projeto de Lei consiste na inclusão da regulamentação acerca de empréstimos para o devedor em fase de recuperação judicial. Esse tipo de empréstimo, conhecido como dip financing, implica muitos riscos para o financiador e, por isso, poucos bancos aceitam fazê-lo.

Na avaliação do relator, esse é um dos pontos altos do projeto. Ele ressalta que a regulamentação do dip financing poderá auxiliar o devedor em crise profunda e que ainda pode ser viável a obter créditos de última hora, afastando-o da falência. Conforme o texto aprovado, se autorizado pelo juiz, o devedor em recuperação judicial poderá fazer contratos de financiamento para tentar salvar a empresa da falência.

Se a falência for decretada antes da liberação de todo o dinheiro do financiamento, o contrato será rescindido sem multas ou encargos. Esse financiamento poderá ser garantido com bens da empresa, como maquinários e prédios, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária.

Em caso de falência, como forma de proteger os créditos derivados deste tipo de financiamento, o projeto de Lei nº 4.458/2020O altera a ordem de pagamento dos credores, dando preferência para os créditos derivados de dip financing, que ficam atrás somente da preferência dada às despesas cujo pagamento antecipado seja indispensável à administração da falência e dos créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 meses anteriores à decretação da falência, até o limite de 5 salários-mínimos por trabalhador.

Consolidação Processual e Consolidação Substancial no processo de recuperação judicial:

O projeto também regulamenta os pedidos de consolidação processual. A consolidação processual permite que empresas que integrem um grupo econômico, ingressem conjuntamente com um só pedido de recuperação judicial.

Na consolidação processual os atos processuais dos devedores são independentes, assim como seus ativos e passivos. Os meios de recuperação serão independentes e específicos para cada devedor em consolidação processual, admitida apresentação em plano único. Além disso, os credores de cada devedor deliberarão em assembleias gerais de credores independentes e a consolidação processual não impede que alguns devedores obtenham a concessão da recuperação judicial e outros tenham a falência decretada.

Nos casos em que o juiz constatar a interconexão e a confusão entre ativos ou passivos dos devedores em consolidação processual, de modo que não seja possível identificar a sua titularidade sem excessivo dispêndio de tempo ou de recursos, poderá, de forma excepcional, autorizar a consolidação substancial.

Para que seja possível a autorização da consolidação substancial, deverão ocorrer, no mínimo, duas das seguintes hipóteses:

 

  • Existência de garantias cruzadas;
  • Relação de controle ou de dependência;
  • Identidade total ou parcial do quadro societário;
  • Atuação conjunta no mercado entre os postulantes.

Na consolidação substancial, o grupo societário em recuperação judicial não apenas tem o pedido processado conjuntamente, como as empresas que o integram perdem sua autonomia patrimonial. Os ativos e passivos dos devedores serão tratados como se pertencessem a um único devedor, as garantias fidejussórias e de créditos detidos por um devedor em face de outro serão extinguidas imediatamente, o plano de recuperação judicial será unitário e sua rejeição implicará a convolação da recuperação judicial em falência de todos os devedores sob consolidação substancial.

Extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida:

O Projeto visou reafirmar a vedação da extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, e aos controladores e administradores da sociedade falida, permitindo que tal extensão se dê apenas se decretada a desconsideração da personalidade jurídica, que deverá atender aos requisitos previstos no art. 50 do Código Civil e ao procedimento dos artigos 133 e seguintes do Código de Processo Civil.

Dever de celeridade e publicidade do procedimento de recuperação judicial e do procedimento falimentar:

Por fim, o projeto buscou destacar o dever de celeridade dos processos disciplinados na Lei de Recuperação e Falência, afirmando que os mesmos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo o habeas corpus e outras prioridades estabelecidas em leis especiais.

Além disso, impôs o dever de publicidade aos Registros Públicos de Empresas, em cooperação com os Tribunais de Justiça, para que os mesmos mantenham um banco de dados público e gratuito, disponível na rede mundial de computadores, com a relação de todos os devedores falidos ou em recuperação judicial.

 

*As informações tiveram como fonte a Agência Senado.