STJ muda de posicionamento e admite ação rescisória em favor da Fazenda para adequar decisão judicial definitiva a jurisprudência posterior
Na mesma semana em que o STF admitiu a possibilidade de quebra de decisão judicial definitiva em sede tributária para fins de autorizar a Fazenda a exigir tributos quando da mudança de entendimento da Corte, o STJ admitiu a interposição de ação rescisória com fundamento em alteração jurisprudencial. Para melhor entender, cumpre esclarecer que ação rescisória é um processo judicial autônomo que visa rescindir uma decisão judicial transitada em julgado, ou seja, da qual não cabe recurso. As hipóteses para ajuizamento de ação rescisória de uma decisão judicial definitiva estão estabelecidas em lei e se reportam a situações específicas: decisão proferida em prevaricação, concussão, corrupção, impedimento ou incompetência; resultante de vícios ajustados entre as partes a fim de fraudar a lei; decisão que ofender a coisa julgada, violar manifestamente norma jurídica, fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada, fundada em erro de fato verificável do exame dos autos ou quando for obtida prova nova cuja existência era ignorada ou de que não se pôde fazer uso ao tempo do processo. Ou seja, as hipóteses de cabimento de ação rescisória visam resguardar a segurança jurídica e perenidade das decisões judiciais definitivas a fim de manter a ordem social. Justamente por essa razão, a alteração de entendimento jurisprudencial não era, até o momento atual, hipótese de cabimento de ação rescisória visando desconstituir direito obtido através de processo judicial regular cuja decisão final não comporte mais recurso. Ocorre que o STJ, pela primeira vez e por maioria de votos, admitiu que a Fazenda Nacional use ação rescisória para desconstituir acórdão que lhe foi desfavorável, em um caso tributário. A mudança de entendimento se deu em sede de julgamento pela 1ª Seção da Ação Rescisória 6.015 que visava desconstituir acordão da 2ª Turma do STJ no REsp 1.427.246, em que fora mantida decisão favorável em ação ajuizada pelo Sindicato das Empresas de Comércio Exterior do Estado de Santa Catarina. Esta ação rescisória proposta pela Fazenda pretendia desconstituir o direito obtido pelos contribuintes em decisões favoráveis prolatadas entre 2014 e 2015 que lhes garantia a isenção do recolhimento do IPI no momento da revenda de produtos importados. Isso porque, o STJ sempre entendeu que as empresas que revendem produtos importados deveriam recolher o IPI no momento da revenda, apesar do recolhimento do mesmo tributo no momento do desembaraço aduaneiro. No entanto, em 2014, o STJ mudou de posição quando do julgamento do EREsp 1.411.749 e passou a dispensar o recolhimento do tributo no momento da revenda. O entendimento benéfico aos contribuintes durou apenas um ano e em 2015, quando do julgamento do Tema 912 em sede de recursos repetitivos, o STJ voltou a autorizar a cobrança do IPI tanto no desembaraço quanto na revenda. A partir de então, a Fazenda passou a ajuizar ações rescisórias visando derrubar o direito obtido pelas contribuintes durante o período em que o STJ dispensou o recolhimento do IPI no momento da revenda de produtos importados, visto o recolhimento do tributo no momento do desembaraço. Até então, o STJ não estava acolhendo os pedidos de ação rescisória da Fazenda com fundamento na Sumula 343 do STF que dispõe que “não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”. Porém, para surpresa dos contribuintes que operavam suas atividades confiantes no direito reconhecido judicialmente, o STJ mudou a posição da 1ª Seção por entender que haveria risco de prejuízos aos princípios da livre iniciativa e concorrência, além de ofensa à isonomia em relação aos demais contribuintes. Cabe salientar que esta mudança de entendimento afeta não somente os contribuintes de IPI de revenda de produtos importados que possuem decisão judicial favorável à isenção do imposto no momento da revenda, mas também todos os demais contribuintes, uma vez que sinaliza a mudança de entendimento do STJ no sentido de que passa a ser possível usar ação rescisória para desconstituir o resultado de processo já encerrado quando, posteriormente, houver a mudança e a consolidação de posição em sentido oposto ao que foi decidido, ao menos em favor da Fazenda.