Em decorrência do impacto econômico da pandemia do novo Coronavírus e do quadro de recessão que repentinamente passa a se projetar para o ano de 2020, os Poderes Executivo e Legislativo federais estão publicando diariamente uma série de medidas visando atenuar a carga financeira suportada pelos contribuintes neste novo cenário que vem se concretizando.
No dia 03 de abril de 2020 foi então publicada a Portaria nº 139/2020, do Ministério da Economia, prorrogando o prazo para o recolhimento das contribuições ao PIS/Pasep e COFINS, bem como das contribuições previdenciárias patronais. Em 07 de abril de 2020 sobreveio a Portaria nº 150/2020 que ampliou a abrangência da Portaria n. 139/2020 para prorrogar também o vencimento da Contribuição Previdenciária Patronal sobre a Receita Bruta (CPRB) e de Funrural, posto que antes o diferimento estava restrito à contribuição previdenciária patronal devida sobre a folha de salários
A tão aguardada medida, porém, está longe de ser a solução aguardada pela classe empresarial para reduzir o impacto tributário no caixa das empresas ao longo dos próximos meses em que a crise tende a se agravar.
Primeiramente porque restrita a alguns poucos tributos, ficando de fora dessa temporária “desoneração” (lembre-se de que se trata simplesmente de postergação dos prazos de vencimento originais), espécies tributárias que representam, habitualmente, um significativo peso para os contribuintes, a exemplo do IRPJ, da CSLL, do IRRF, do IPI, dentre outros tantos.
Depois porque tal medida está limitada à prorrogação do vencimento das contribuições ao PIS/Pasep e COFINS, e das contribuições previdenciárias patronais relativas, apenas, às competências de março e abril de 2020, que agora poderão ser pagas no prazo de vencimento das contribuições devidas nas competências julho e setembro de 2020, respectivamente.
Por fim, resta ainda saber se a referida Portaria nº 139/2020 buscou também postergar o vencimento das contribuições ao PIS/Pasep e COFINS nas hipóteses em que seja devida sua retenção pelo estabelecimento tomador, já que seu texto não é claro a este respeito. Afinal, uma vez vedada a aplicação de tal regra para as situações em que a retenção dessas contribuições seja obrigatória, fatalmente os contribuintes sujeitos a tal retenção incorrerão em ônus financeiro maior do que aqueles contribuintes cujas atividades não exijam a retenção de seus clientes, revelando um nítido tratamento anti-isonômico, vedado pela Constituição Federal de 1988.
Em razão das notórias limitações das medidas veiculadas pela Portaria 139/2020, vêm ganhando cada vez mais relevância as discussões travadas no meio jurídico acerca da possibilidade, ou não, de aplicação ao caso presente do texto da Portaria MF nº 12, de 20 de janeiro de 2012, que foi publicada originalmente em decorrência de desastres naturais ocorridos no ano de 2012 em pequenas regiões e municípios, muito embora até o presente momento continue plenamente vigente.
A mencionada Portaria prorroga o vencimento de tributos federais administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil em 3 (três) meses para os contribuintes domiciliados em municípios abrangidos por Decreto Estadual que tenha reconhecido o estado de calamidade pública, prazo superior, portanto, ao definido na atual Portaria 139/2020. Dentro deste mesmo espírito, a propósito, importa também destacar a superveniência da Instrução Normativa RFB nº 1243, de 25 de janeiro de 2012, adiando os prazos para o cumprimento de algumas obrigações acessórias.
Dito de outra forma, segundo a Portaria MF nº 12/2012, os contribuintes domiciliados nos municípios que estejam sob decreto estadual reconhecendo o estado de calamidade pública podem prorrogar o vencimento de tributos federais por três meses.
Paralelamente, estados como, por exemplo, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, já publicaram Decretos Estaduais que decretam o estado de calamidade pública.
Em que pese a Portaria MF nº 12/2012 esteja plenamente vigente, tem repercutido na imprensa especializada (veja aqui a notícia) posicionamento contrário por parte da Receita Federal em acatar os efeitos determinados pela dita Portaria. A justificativa é que a Portaria se aplicaria somente a desastres naturais que atingiram pequenas regiões e municípios, categoria em que não se enquadraria a pandemia do novo Coronavírus.
Ocorre que, a despeito de eventual manifestação por parte da Receita Federal, fato é que, estando vigente a Portaria MF n. 12/2012 e não havendo restrições em seu texto, abrem-se portas para as discussões jurídicas acerca da sua aplicação diante do cenário atual.
Ademais, também é fato que o ordenamento jurídico pátrio socorre aos contribuintes de fundamentos jurídicos suficientes para que se entenda pela prorrogação dos prazos de vencimento dos tributos federais independentemente dos limites da Portaria MF nº 12/2012.
Já é possível identificar decisões deferindo liminares em ações de mandado de segurança ajuizadas pelo Brasil afora, muito embora elas não representem uma unanimidade no judiciário, até porque, dada a rapidez dos acontecimentos recentes, ainda estamos longe de ter uma jurisprudência consolidada sobre o tema.
É interessante notar que nem todas as decisões que concedem liminar para prorrogação do pagamento dos tributos federais adotam como fundamento a própria Portaria MF n. 12/2012. Exemplificativamente, a decisão proferida pela 21ª Vara Federal do Distrito Federal nos autos do processo 1016660-71.2020.4.01.3400 foi além do exame do Direito Tributário, utilizando-se de fundamentos do Direito Público e do Direito Constitucional para resolver a controvérsia.
Importa ressaltar, contudo, que, no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4º Região, as demandas judiciais fundadas na aplicação da Portaria MF n. 12/2012 vêm obtendo decisões negativas, como dá conta, a propósito, recente notícia veiculada no site daquele Tribunal. Tal circunstância tem motivado muitos contribuintes a proporem suas ações perante a Justiça Federal do Distrito Federal, cujo Tribunal correspondente (TRF1) vem manifestando entendimento mais favorável.
Outro ponto de relevo é o fato de que algumas das decisões de deferimento da postergação de pagamento de tributo federal impuseram uma circunstância condicionante, como a manutenção dos postos de trabalho enquanto perdurar o período de prorrogação.
Desta forma, considerando ser pouco provável que sobrevenha, nos próximos dias, algum novo regramento ampliando significativamente o espectro da Portaria nº 139/2020, ou mesmo diante das razoáveis dúvidas sobre sua amplitude (se aplicável, igualmente, aos casos em que devida a retenção das contribuições para o PIS e da COFINS), a impetração de mandado de segurança passa a ser uma medida a ser considerada pelos contribuintes que se encontrem na situação excepcional de ter que fazer escolhas de altíssimo impacto financeiro (como, por exemplo, a de pagar tributos ou os salários de seus funcionários) ou queiram se precaver contra a possível resistência de seus clientes em acatar prontamente a dispensa da retenção dos valores de PIS e de COFINS com amparo no precário e vago texto da Portaria nº 139/2020.
Independentemente da estratégia a ser adotada, recomenda-se fortemente que as empresas rapidamente avaliem as medidas à disposição e realizem projeções para os meses que se seguirão sob os efeitos adversos gerados pela pandemia do novo Coronavírus, a fim de que eventuais ações judiciais possam ser tomadas em tempo.
Neste panorama de incertezas, fica o desafio aos operadores do Direito de interpretar as normas jurídicas e trazer à sociedade e, em especial, ao meio empresarial, as soluções possíveis de serem adotadas, tal como já proposto pela equipe do Negócios Jurídicos (veja aqui), sem que tenhamos a referência de casos semelhantes na jurisprudência brasileira.
Estamos à disposição para orientá-lo!